razão da sensibilidade

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Sim, você fala grego.

Duvida? Faça um teste agora mesmo: ligue para a sua mãe e diga que teu CSS, embora pareça seguir o estipulado pelo W3C, não degradadecentemente em versões antigas dos browsers baseados em Mozilla.

Tua mãe vai confirmar: você está falando grego. Só não espere que ela vá correndo se gabar disso para as amigas, porém. Ela deve se lembrar muito bem daquela vez em que te perguntou inocentemente se CD não tinha lado B e você, rindo, respondeu em grego. Ela se sentiu uma tonta.

Não, não estou dizendo que a tecnologia te tornou insensí­vel (ou, parodiando um grande amigo e frasista, que você tenha virado um engenheiro frio e calculista). Apenas estou sugerindo que talvez valha a pena aprender mais duas palavrinhas em grego: hybris e sophrosyne.

Hybris serve, basicamente, para as coisas que lhe sobem a cabeça e te embriagam: arroubos, paixão, vaidade, arrogância, poder. Tudo isso pode lhe turvar a razão e fazer de você uma criatura descontrolada e desumana.

Razão pode subir à cabeca. Sim, razão, sobretudo a racionalidade
técnica. Basta ler um livrinho ou dois daquelas coisas que arrepiam os leigos (C++, termodinâmica, legislação tributária, o que for) para que o resto da humanidade pareça quilômetros abaixo da sua altitude rarefeita.

E bota rarefeita nisso: se você se embriagou com algum conhecimento que engoliu sem mastigar, é sinal de que teu cerébro já está running in UNsafe mode. Pior: é sinal de que teu bom-senso tem uma severafalha de segurança.

Muitos filosófos gregos viam na embriaguez da hybris a raiz de um monte de males, e o remédio para isso seria algo realmente com nome de remédio: sophrosyne.

Sophrosyne se traduz por temperança, por parcimônia, se traduz por manter a cabeça no lugar sem se deixar levar por excessos. Remédio de uso diário, sem contra-indicação e que custa muito mais barato do que aquilo que “dá barato”.

Eu não sou imune a hybris. Ninguém é. Nosso OS é assim, versão beta, cheio de melhorias pendentes, mas eu, como se diz nos AA, agradeço por cada dia em que não me embriago.

Eu me embriaguei outro dia diante de umas 600 pessoas. Eu jamais
falaria grego diante de uma platéia notoriamente não-técnica, mas me deixei empolgar e pronto, lá estava eu a um passo de falar da importância da folksnomia para a construção de eixos de afinidade que sirvam como fatores aglutinadores em ambientes sociais abertos.

Quaaaaaase falei, quase, mas fui salvo por uma esplêndida cara de paisagem na platéia, a infalivel reação salutar e involuntária de quem contempla um pobre-diabo perdendo o pé (e a cabeça e o fio da meada e tudo).

Aquele olhar perdido foi o balde de água fria de que eu precisava. Recompus-me, voltei como pude ao que queria dizer e, sobretudo, recuperei a noção do meu verdadeiro tamanho: o fato de que estar no palco não era um direito divino. Eu estava ali porque aquelas pessoas abriram um espaço na vida delas para ouvir o que eu tinha a dizer. Se é que eu tinha algo a dizer.

Elas podiam nem ter vindo, podiam muito bem seguir vivendo sem meus 20 minutos de blablablá. Elas eram especialistas em algo em que eu era leigo. Elas eram responsáveis pela condução de negócios gigantes, com milhares de empregados dependendo das suas decisões diárias.

Se algo deveria me subir à cabeça era a gratidão e o senso da
responsabilidade do meu papel naquele exato momento. A todos os que me ouviram e ouvem cada palestra ou podcast, meu muití­ssimo obrigado. Retroativo, inclusive 🙂

Há duas outras coisas pela qual sou muito grato ao destino: ter
convivido e trabalhado com grandes expoentes da comunicação brasileira e mundial e ter aprendido com eles que nada, nada justifica arrogância. Nada.

E te juro: manter o estilo é muito, muito mais difí­cil que aprender CSS. E funciona em todas as plataformas.

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